A vida com microcefalia: dos desafios à superação

“De novo!”, diz José Lucas quando sua mãe começa a falar novamente sua história. Beatriz Cardoso tem 39 anos e veio morar em Teresina em busca de tratamento para o filho. Os dois saíram de Inhuma, a mais de 200 quilômetros de Teresina, deixando família e amigos para construir uma nova vida na capital. José Lucas tinha somente dois anos de idade quando recebeu o diagnóstico de paralisia cerebral.

José Lucas durante terapia com videogame. (Foto: Ascom Reabilitar)

Passados oito anos, Beatriz teve mais um diagnóstico sobre o filho: a microcefalia. A notícia veio em outubro de 2015, quando o país estava assustado com o aumento de casos com a doença, sendo relacionada ao zika vírus. “Foi um susto muito grande, mas eu já não o vejo como uma criança com deficiência. Mães de bebês com microcefalia me perguntam como é cuidar do meu filho, eu respondo que nós somos tão especiais quanto eles”, diz Beatriz Cardoso.

José Lucas tem nove anos, está aprendendo a ler e escrever, caminha na ponta dos pés, joga capoeira, usa óculos, é comunicativo, faz amizade fácil e adora ir para o clube tomar banho de piscina. “Meu filho tem uma vida normal”, acrescenta Beatriz. “Pronto, acabou”, pede o garoto, ansioso para ir até a sala da sua terapia com videogame, a reabilitação virtual.

A história de Beatriz Cardoso, contada por ela inúmeras vezes para cada vez mais pessoas, é uma inspiração para mães como Socorro Bezerra, que teve o primeiro filho aos 34 anos. “Ele nasceu em casa, com a ajuda de uma amiga. E quando fomos para a maternidade eu fiquei internada com ele”, lembra. Com seis meses, João Guilherme ainda não foi diagnosticado com microcefalia, mas já recebe estimulação precoce para potencializar o seu desenvolvimento. O pequeno também nasceu com um problema no coração e possui suspeita de Síndrome de Down. “Eu dou muito carinho e amor para ele. E sonho que ele tenha saúde, estudo, que seja feliz”, comenta, com os olhos brilhando, Socorro Bezerra, que mora na zona rural de Teresina.

João Guilherme aguarda diagnóstico de microcefalia e Síndrome de Down. (Foto: Ascom Reabilitar)

Os desafios enfrentados por Beatriz Cardoso e Socorro Bezerra também são rotina na vida da Josiane Morais, que, com apenas 22 anos, recebeu a notícia de que o seu terceiro filho nasceu com microcefalia. “Eu cuido dele como cuido das minhas outras filhas. Não o trato como se tivesse uma doença. Se eu ficar pensando nisso, entro em depressão”, conta Josiane, mãe de Maria Vitória e Emanuele, de três e quatro anos, e do Heitor, de cinco meses.

A família é de uma cidade há 87 quilômetros de Teresina – Barro Duro – e veio morar na capital para que o caçula receba estimulação precoce no Centro Integrado de Reabilitação (Ceir), mesmo local onde João Guilherme e José Lucas fazem tratamento.

Josiane Morais acompanha cada evolução do filho Heitor. (Foto: Ascom Reabilitar)

É lá onde funciona a única Clínica de Microcefalia do Piauí, implantada em março deste ano pelo Governo do Estado, por meio da Secretaria de Estado da Saúde do Piauí (Sesapi), em parceria com o Ministério da Saúde. O local já atende 64 bebês, prestando assistência às famílias, e ultrapassa a marca de 3.280 atendimentos realizados.

Beatriz, Socorro e Josiane são donas de casa e sobrevivem do BPC (Benefício de Prestação Continuada), um direito garantido a famílias de pessoas com deficiência. Além do amor por seus filhos, elas têm em comum caminhos que vão de desafios à superação, histórias que nos convidam a viver mais a vida e reclamar menos dela.


Texto: Cláudia Alves – Comunicação Reabilitar